O dom das palavras
“Escrevo a palavra girafa
e tu esticas o pescoço.
Escrevo a palavra cachecol
E tu enroscas-te como um caracol.
Escrevo a palavra gripe
E tremes debaixo do lençol.
Escrevo a palavra porta
E tu sais a correr deste poema
Que te pareceu coisa bem torta
Teresa Guedes
Pedido de casamento
Ó condessa, condessinha,
ó condessa de Aragão,
venho pedir-te uma filha
que tão lindas elas são.
Minhas filhas não te dou
nem por ouro nem por prata.
Uma foi para o Japão
de viajar não se farta.
Outra foi de submarino
para as profundezas do mar,
tem a paixão dos peixinhos,
a ti não te vai ligar.
Outra foi para enfermeira,
está na sala de operações,
se a quiseres abraçar
levas duas injecções.
Tão contente que eu vinha
tão triste me vou achar.
Nas raparigas de agora
ninguém consegue mandar.
Luísa Ducla Soares
Quem és tu?
Tenho uma mota vermelha
com um leitor de CD,
computador, internet
e uma nova TV.
Tenho piscina aquecida,
um cavalo para montar,
e como sempre marisco
no restaurante, ao jantar.
Tenho sete namoradas,
as sete com moradias,
as sete com lindos olhos,
as sete com ricas tias.
Tenho um pai com muitas notas
e mãe cheia de pulseiras,
são de prata os meus talheres
e de ouro as minhas torneiras.
Afinal tu não existes,
és só aquilo que tens,
um zero todo coberto
de uma montanha de bens.
Luísa Ducla Soares
Afinal tu não existes,
és só aquilo que tens,
um zero todo coberto
de uma montanha de bens.
Luísa Ducla Soares
A Lapiseira
Eu posso viver sem sol,
sem ninguém à minha beira.
Mas só não posso viver
sem a minha lapiseira.
Rodo com ela nos dedos,
é varinha de condão,
breve fósforo que acende
lumes de imaginação.
Pássaro de bico negro,
de negro, negro carvão,
que leva com suas asas
a minha voz e canção.
Chamo o sol e os amigos,
assim,à minha maneira,
viajando no papel
só com uma lapiseira.
Luísa Ducla Soares
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